sexta-feira, 17 de novembro de 2006

Museu de canudinho e detergente

Quero viver um amor
mas que seja um amor diferente
não é preciso durar para sempre,
mas preciso que seja intenso.
não é preciso que seja correto,
preciso que seja sincero.
Ele é feito aos pouquinhos
Vai se formando segundo a segundo
Palavra a palavra, olhar a olhar.
E vai se tecendo fio a fio,
Como incessante trabalho de tecedeira caprichosa.
Fio a beijo, fio a abraço, fio a toque, fio a sorriso.
E vai se formando e entrelaçando. Como uma esteira ou colcha
Estendida no chão pra gente deitar
E olhar o céu coalhado de estrelas.
Elas se espalham céu afora
E a gente noite adentro.
Não quero um amor pra mim
Quero um amor que esteja comigo
Não! Não quero posse privada
Quero é parceria
Quero uma imensidade de momentos pra lembrar
Momentos eternos nos poucos segundos em que se vão
E com eles montar um museu do meu amor
Cada eterno momento exposto placidamente
Dentro de uma bolha de sabão

sábado, 11 de novembro de 2006

Sonho de ponta

Lá está novamente a menina, dançando no meio da cozinha e sonhando, sonhando com o dia em que será realmente bailarina. Os pés descalços, sujos e machucados sobem na meia-ponta no chão frio, e ela sonha com sapatilhas de ponta cor-de-rosa e um linóleo estendido.
Ela sonha em aprender os nomes dos movimentos que vê e sonha em aprender a executá-los.
Faz piruetas marcando cabeça num ponto sobre a pia e sonhando com um espelho. Apóia-se na parede para fazer gran-pliés, sonhando com uma barra. Desvia das cadeiras para fazer um developé. Mira seu difuso reflexo na geladeira para observar a posição dos braços. E sonha com alguém ali para corrigir os defeitos que ela não vê.
Programa o pequeno rádio para repetir a única música no piano que tem. E dança. Dança e sonha. E no seu sonha ela não está descalça nem em mangas de camisa, na abafada cozinha. Ela vai nas pontas de sua sapatilha, com sua fina meia-calça, seu collant e tou-tou brilhantes. O cabelo, caprichosamente preso num coque e enfeitado por uma tiara, e o rosto delicadamente maquiado. E dança como se flutuasse, ao som de um piano de cauda e frente a uma platéia que a aplaude de pé.
Então ela abre os olhos e aterrisa dolorosamente na realidade. Está novamente descalça e descabelada na apertada cozinha. A luz, com mau contato, se apagou; e a música acabou. A cidade iluminada lá fora, vista pela janela aberta; a sua platéia; não pára a sua agitação noturna para aplaudir.
A menina interrompe sua dança, vai tomar banho, deitar, dormir. E quem sabe, adormecida, retorne ao seu sonho. Sonho cor-de-rosa ao som do piano. Sonho de ser, de verdade, bailarina.

quarta-feira, 8 de novembro de 2006

Why perfect...

Saí pela rua e vi um mundo lindo. Nada tinha mudado de lugar, mas eu via mais flores, mais folhas, ouvia mais pássaros, e um Sol quente de verão clareava tudo. E a música parecia mais melodiosa em meus ouvidos, e as pessoas nas ruas pareciam mais vivas aos meus olhos, e um Papai-Noel adiantado na janela vinha avisar que o ano está acabando.
E alguma força misteriosa me fez fazer uma pirueta no meio da rua, e sorrir ao senhor gorducho que me olhava curioso. E ele retribui o sorriso.
E numa esquina qualquer um incrível perfume de flores me entorpeceu os sentidos e passei a dar sorrisos sem motivo, porque na verdade tinha milhões de motivos para sorrir. Milhões de motivos porque tenho uma vida perfeita.
Perfeita porque uma borboleta esvoaçou à minha frente, e um passarinho qualquer pousou num fio.
Perfeita porque estava voltando da escola com uma mochila pesada sob um Sol quente, porque tinha da onde vir e pra onde ir, e coisas das quais eu gosto para carregar, e porque moro num país onde o Sol brilha o ano inteiro.
Perfeita porque tinha quem encontrar no meio do caminho para trocar uma palavra animada.
Perfeita porque não sou uma modelo de corpo perfeito nem pele de pêssego, então pouco me importa se tenho um quilo ou um cravo a mais, isso não vai definir as pessoas que gostam ou não de mim.
Perfeita porque uso meu All-Star rosa velho e rasgado, e não o troco por nada.
Perfeita porque vai ter algo me esperando quando chegar em casa, nem que seja meu cachorro esfomeado es as correspondências.
Perfeita porque tenho um quarto bagunçado cheio de mim pra arrumar.
Perfeita porque posso arrancar os sapatos, colocar um som e achar um restinho e brigadeiro na geladeira.
Perfeita porque posso me jogar na cama desarrumada e fechar os olhos.
Perfeita porque posso tomar um banho gelado pra afastar o calor.
Perfeita porque também tenho problemas e choro, e tem dias em que estou mal e me sinto doente. Porque também grito e xingo e tenho raiva. Porque amo, mas também odeio, e posso tanto agradar como desagradar.
Perfeita porque alegrias e tristezas andam de mãos dadas, e elas me fizeram do jeito que sou.
Perfeita porque de repente, hoje, vi o mundo por trás de lentes cor-de-rosa (ou roxas, que são mais do meu agrado).
Perfeita porque posso deitar o chão do quintal para ver a Lua ou as estrelas (e elas sorriem).
Perfeita porque posso rir e chorar sem motivo, porque tenho milhões deles.
Minha via é perfeita por ser simples e comum.E eu sou tão incomum por ver perfeição nela.

segunda-feira, 6 de novembro de 2006

Brigadeiro

Pensamentos tomados pelo filme Efeito Borboleta.
"O simples bater e asas de uma borboleta pode causar um tufão do outro lado do mundo."
O leque de possibilidades é imenso quando se pensa no que poderia ter acontecido se algo não fosse extamente como foi. Se não tivesse saído aquela noite, se não tivesse ido àquela excurssão... então o que aconteceria com nós? E se tudo tivesse acontecido mais rápido, e se tivesse te encontrado antes? E se nunca tivesse te conhecido, como estaria agora? E se tivesse me decidido antes, como estaria agora? Qual seriam minhas perspectivas agora? E como será meu próximo ano graças às escolhas que fiz pouco antes?
E como seria a história se fosse modificada? Será que estaria aqui agora, comedo brigadeiro e estudando para a prova de geografia? (sim, é isso que estou fazendo agora)
Nesse louco jogo de possibilidades, o melhor é afastar a tentação de cair em pensamentos de "será que" e viver o que tem de ser vivido agora; deixar o futuro para o futuro.

"Amor é a vida acontecendo no momento. Nem passado nem futuro. Presente puro. Eternidade numa bolha de sabão."

quinta-feira, 2 de novembro de 2006

Finados...

O cemitério numa tardde de finados, estava cheio. Eram crianças correndo lá fora, conversas animadas, carrinhos vendendo picolés. Tem de minlho verde? Cadê a cumadre? Ah, dá um de côco então.
Um local normalmente silencioso, nesse dia se faz abrulhento e agitado. O movimento por entre as alamedas estreitas é intenso, de gente indo pra cima e pra baixo, em bandos, indo visitar seus mortos. Na entrada vê-se os belos túmulos, de mármore negro e branco. E conforme vai-se adentrando para os fundos do pequeno cemitério, acham-se os simples túmulos. Baixos, cobertos de azulejos e com simples placas. Alguns simplesmente rebocados e pintados de branco, sem nenhum epitáfio para que se reconheça, apenas uma minúscula placa de madeira com um número. Não datas ou nomes, só um número, o número que sobrou a esse desconhecido, o número de sua cova. Todos os simples túmulos enfeitados por feias flores de plástico, ridiculamente coloridas, sem a menor intenção de parecerem reais.
E num ato que talvez lhes pareçam normal, as pessoa sentam-se sobre os túmulos como se estivessem na sala de casa, e começam uma animada conversa. Excurssão ao cemitério só para seguir com a tradição.
Então a chuva chega inesperada, fazendo todos correrem procurando abrigo. E o cemitério retorna à antiga paz.

Quando meu bem vai embora....

Procurando inspiração nas gotas da chuva que caem incessantemente.
O silêncio da casa deserta na madrugada só é quebrado pelo som do teclado, que bate acelerado sua melodia de uma nota só, apesar de tantas teclas.
O vento fresco que entra pela janela, com ar de chuva faz o corpo arrepiar. Já estou mesmo toda quebrada, sou como uma boneca de pano, que se deixa cair na cadeira sem forças para levantar.
A solidão só faz crescer a saudade...quando a semana, mesmo reduzida, parece ter vinte dias, porque você não está aqui.

"O relógio das saudades anda suspenso nas horas. Só quem não ama não sabe quando meu bem vai embora. Quando meu bem me visita, se tô doente melhora. Retomo a mesma doença quando meu bem vai embora. Quando meu bem vai embora minuto parece hora, hora parece dia, dia pare ano, quando meu bem vai embora."
(trecho do espetáculo Os Sons Antigos de Águas Apagadas)

a saudade tem o doce cheiro de flores depois da chuva em uma noite de verão, porque sei que essa saudade dura só mais um dia, então te encontrarei.
Doce saudade, só faz encher o coração de cheiro de flores depois de chuvas de verão, só porque estou lembrando de ti.