segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Ahh, essa menina....


Lá vai a menina falando de si mesma na terceira pessoa. Muitas vezes ouviu dizer que era perfeita, mas tem real consciência que não é. Porque insiste em ser modesta, mesmo quando sabe que não devia ser, e já ouviu muitos “Deixa de ser modesta, que saco!”.
A menina fica sozinha em casa, larga o uniforme amarrotado em cima da cama, esquece de pôr as meias pra lavar e acaba sempre perdendo um pé delas. Passa o tempo lendo revistas e livros ou desenhando e ouvindo música, e se esquece de lavar ou passar suas roupas, e depois não tem roupas limpas ou passadas pra vestir, ou esquece de lavar as louças, e sua mãe quando vê fica louca, ou esquece de estudar, fazer aquele exercício, separar a apostila que tinha de levar pra aula seguinte.

Esquece da vida e se atrasa pra aula de dança, desce as ruas da pequena cidade quase correndo e já chega na aula cansada. Fica sozinha e anda de calcinha pela casa, mas às vezes esquece alguma cortina aberta e corre a se abaixar para evitar o olhar dos vizinhos. Senta-se à mesa e tira os chinelos, estende uma perna apoiando o pé na outra cadeira e quando levanta esquece os chinelos embaixo da mesa. Esquece a garrafa d’água destampada e o pacote de pão aberto. Coloca o som no último volume, canta e dança feito louca (pobres vizinhos...).

Acaba com suas unhas, arrancando pedacinhos, cortando-as muito curtas, acaba se machucando. Não resiste a cutucar uma espinha na testa ou espremer um cravo no nariz. Passa os dias contando calorias, mas acaba deslizando e se tacando num pacote de bolachas ou numa lata de leite condensado.
Isola-se do mundo com seu MP4, e se transporta a um mundo paralelo, observando as pessoas, tentando imaginar o que sentem, porque são assim e não assado. Durante as aulas, ouve música, escreve textos na agenda e nos cadernos, desenha nas folhas da apostila onde devia fazer exercícios, se perde em pensamentos, não revela o que sente. Vê em cada coisa do seu dia um assunto para novos textos, escreve vários e muitos outros ficam só no projeto mental. Em vez de dizer o que sente, transforma os sentimentos em poesias, publica-os no blog e pede para estranhos lerem.
A menina se perde em sonhos, pensamentos, ilusões. Sonha alto mas nunca sai do lugar; as fitas das sapatilhas de ponta que usa em cada um desses sonhos amarram seus pés fortemente ao chão.

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