sexta-feira, 17 de outubro de 2008

De pedra (e alguns sonhos)

Por vezes pareço não ter mais forças. Por vezes tenho vontade de amolecer, dizer feminina, mole e bobamente "não me deixe só" para um alguém que se esconde no vazio. Simplesmente não mais resistir, deixar o peso ceder sobre as pernas moles, escorregar para o chão, escorregar nesse mau-estar.
Não mais resistir frente às centenas de rostos desconhecidos que esbarram meu caminho, aos carros que me cruzam em perigo constante, ao silêncio, à solidão, ao fedor que me invade as narinas, à tontura que me entorpece, às perdas, às ausências, às loucuras das relações e das pessoas. Dissolver. Disminliguir.
Mas então vejo minha silhueta na sombra projetada contra o chão. E percebo que não posso deixar-me amolecer, enfraquecer, pois assim estaria traindo a mim mesma.
Sim. Traição. Pois essa que sou é construção só minha.
Estive sempre sozinha, e sozinha me fiz. Em todos os tombos não apoiei-me em mão alguma para me reerguer. E, em todas as mais insanas dores estive só. Cada lágrima derramada foi matéria-prima do cimento que agora me sustenta.
Tive, por vezes, influências e abraços que me confortaram. Mas sozinha exorcizei meus próprios demônios. Sozinha descobri meios para isso. Apoiei-me na música, nas palavras e nos sonhos. A verdade é que ninguém me conhece por inteiro.
Pois assim me fiz. Sozinha, dura, de pedra. (É, assim mesmo, lembrando Clarice). Meus passos rápidos, meu olhar sério, são a minha obra prima e meu orgulho.
Não sei onde quero chegar. Mas sei que conto sempre comigo mesma.
E não devo me trair.
Fiz-me dura para viver; não para me esconder, não para esmorecer.
Para seguir meu caminho e enfrentar o mundo. (ou se não o mundo, ao menos as barreiras na minha frente)
Sem medo. Sem nojo. Sem vergonha.

3 comentários:

Tulio Bucchioni disse...

Espetacular!

E vivemos então, porque as chaves para esse mundo insano e sem sentido, você já as tem. Desde sempre.

Anônimo disse...

Fez-me lembrar Rilke, 'Cartas ao Poeta'! Leia também !

Marina disse...

E em posts como este a gente nem comenta, porque fica realmente sem palavras diante de um texto tão bom, tão sincero e tão profundo!